Ciência

Nosso cérebro funciona em 11 dimensões

Neurônios se conectam para criar intrincadas formas geométricas multidimensionais, afirmam matemáticos, neurologistas e físicos de projeto suíço.

O cérebro humano é um complexo labirintos de rotas em constante tráfego – caminhos são criados, ampliados e destruídos diariamente. Toda essa infraestrutura é composta de bilhões de neurônios que se comunicam uns com os outros continuamente através de rotas em constante transformação. Permitir essa comunicação é papel das sinapses, e há cerca de um quatrilhão de sinapses em um único cérebro humano.

Se isso parece já complicado o suficiente, imagine mapear toda essa estrutura usando um modelo matemático de 11 dimensões?

Um grupo de pesquisadores do Blue Brain Project, projeto suíço da cientificamente prestigiada EPL (École polytechnique fédérale de Lausanne) destinado a construir uma representação digital do cérebro humano, publicou um surpreendente estudo na revista Frontiers in Computational Neuroscience, em que usa matemática para apresentar uma arquitetura multidimensional do funcionamento de nossos cérebros.

O cérebro, claro, continua a operar nas três dimensões conhecidas, mas as rotas criadas entre os neurônios e o seu tráfego de comunicação, quando tudo é mapeado através da topologia algébrica,  resultam em objetos matemáticos de até onze dimensões.

A topologia algébrica é um ramo da matemática que estuda a relação de pontos e suas conexões em estruturas complexas denominadas espaços topológicos. Kathryn Hess, célebre especialista na área e participante do projeto, explica que a topologia algébrica é útil pois funciona como um telescópio e um microscópio ao mesmo tempo, já que “pode dar um zoom em redes de conexões para encontrar estruturas escondidas, como árvores numa floresta, e ampliar o foco para ver os espaços vazios, como clareiras numa floresta, tudo ao mesmo tempo”

Em 2015, o time de cientistas publicou a primeira cópia digital de um pedaço do neocórtex, a parte mais desenvolvida do cérebro humano. Em sua mais recente pesquisa, usando a topologia algébrica, múltiplos testes foram feitos no tecido virtual para verificar se as estruturas multidimensionais identificadas eram resultado do acaso ou representavam a forma precisa de funcionamento do cérebro.

A seguir, uma vez obtidos todos os resultados do modelo matemático, a equipe buscou confirmá-los em testes com tecido cerebral real, e ao fim observaram o exato funcionamento que esperavam observar, caso as conexões neuronais verdadeiras correspondessem à sua descrição no modelo.

Ao fim, ficou constatado que o cérebro, quando recebe um estímulo, processa a informação em conexões que utilizam tantas dimensões matemáticas quanto possível.

“Nós descobrimos um mundo que jamais imaginamos existir”

O propósito dos pesquisadores é elaborar uma representação matemática que revele as interações multidimensionais do cérebro. Após construir um modelo básico do cérebro humano, a medida em que a equipe analisava como novas conexões se formavam entre os neurônios, progressivamente foi preciso acrescentar novas dimensões para descrever as estruturas que se formavam.

A equipe de neurologistas, físicos, matemáticos e engenheiros computacionais inicialmente focou seu trabalho em “cliques” e “cavidades”, a fim de representar as estruturas e espaços no interior do cérebro. Quando neurônios formam um “clique”, eles se conectam a cada outro neurônio do mesmo grupo de modo que todos formam um objeto geométrico definido. Quantos mais neurônios participam de um “clique”, mais conexões os neurônios do grupo formam entre si, e maior é a dimensão do objeto geométrico.

Um dos membros da equipe, o matemático Ran Levi, da Aberdeen University, explicou o procedimento: “o surgimento de dimensões matemáticas mais elevadas quando o cérebro está processando informações significa que os neurônios da rede de conexões reagem a um estímulo de forma extremamente organizada. É como se o cérebro reagisse a um estímulo construindo e depois destruindo uma torre de blocos multidimensionais, começando com uma, duas e três dimensões e logo depois passando a formas geométricas de quatro, cinco e até mais dimensões. A progressão de uma atividade do cérebro é como um castelo de areia multidimensional que se materializa a partir de grãos de areia dispersos e depois se desintegra”.

“Nós descobrimos um mundo que jamais imaginamos existir”, disse o neurocientista Henry Markram, diretor do Blue Brain Project, em uma entrevista à renomada revista digital EurekAlert. “Há dezenas de milhões desses objetos mesmo em uma pequena fração do cérebro, ocupando mais de sete dimensões no modelo matemático que elaboramos. Em algumas redes de conexões de neurônios, até mesmo encontramos estruturas com mais de onze dimensões”.

O estudo afirma que suas descobertas são biologicamente relevantes e sugere que o cérebro constantemente reconecta seus neurônios durante o desenvolvimento para construir uma estrutura multidimensional. A grande questão agora, para a equipe de cientistas, é descobrir se as complexas atividades que desempenhamos dependem da complexidade dos “castelos de areia” (conjuntos de conexões multidimensionais) que o cérebro pode construir. Neurocientistas há tempos têm buscado descobrir onde o cérebro guarda nossas memórias. “Elas podem estar escondidas nas regiões mutidimensionalmente mais elevadas do cérebro”, Markram especula.

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