Para um psicanalista da sua patente, é ridículo dizer o que ele disse, tudo porque ele deveria ser o primeiro a saber que as melhores construções do amor maduro e consciente vem dos relacionamentos com os iguais, onde podemos mirar a nós mesmos no espelho do outro.
Um cachorro não pode substituir o semelhante a nós mesmos em qualquer relacionamento, porque não reage ao nosso ego maldoso e vitimista, apenas aceita submissamente a nossa personalidade sem ter como reagir.
Confortável para quem tem uma personalidade difícil e foge dos relacionamentos e da crítica alheia, buscando em cachorros e gatos um relacionamento escapista onde esconde o seu lado tenebroso que o animal apenas aceita, porque não lhe foi dado o direito de nos contestar.
Com toda certeza, e isso consta de sua biografia, Freud tinha uma personalidade difícil, mesmo terrível, o que explica o seu discurso em favor dos relacionamentos com cães (abaixo).
Crianças também possuem emoções simples e diretas, e o Mestre do Amor não nos ensinou que deveríamos nos tornar como crianças, puras e simples?
Muita gente que ama cachorros não gosta de crianças, nem das pequenas, que possuem o mesmo tipo de temperamento que ele associa (apenas) aos cachorros.
Não podemos crescer como indivíduos em relacionamentos com animais, que são submissos aos nossos caprichos e emoções egoístas.
Somente diante de um espelho é que podemos ver a nossa face real projetada (no outro) e, conhecendo melhor a nós mesmos, partir para a mudança real e amadurecimento da alma.
Para um doutor que pretendia estudar os mistérios da alma humana, ele ficou à deriva aqui. Forçou uma justificativa para encobrir sua própria personalidade intratável usando um cachorro.
É o que mais se vê atualmente. Pessoas de índole terrível, com dificuldade de se relacionar com seres humanos, migrando para cachorros e dizendo que seres humanos não prestam.
O orgulho aqui não permite revelar o escapismo declarado desse comportamento do ego. O orgulho sempre procura por formas de vida que ele possa subjugar e dominar, sem jamais ser questionado.
Não é errado gostar de cachorros, ou gatos, ou plantas. O errado é se esconder atrás de cachorros porque não se consegue mais viver em sociedade e se adaptar aos outros em função de um ego terrível e individualista que não deseja mudar.
O cachorro não merece isso.
-Freud: Que objeção pode haver contra os animais? Eu prefiro a companhia dos animais à companhia humana.
-Viereck: Por quê?
-Freud: Porque eles são mais simples. Eles não sofrem de uma personalidade dividida, da desintegração do ego, que resulta da tentativa do homem de se adaptar aos padrões de civilização demasiado elevados para o seu mecanismo intelectual e psíquico.
-Viereck: Então, você é um grande pessimista?
-Freud: Não. Não permito que nenhuma reflexão filosófica me roube o prazer das coisas simples da vida.
Os motivos pelos quais se pode amar um animal com tanta intensidade, é porque ele possui emoções simples e diretas, de uma vida singela, liberta dos conflitos de uma sociedade que impõe restrições.
É mais fácil nutrir amor pelo simples.
Trata-se de um afeto sem ambivalência.
Os cães não possuem uma personalidade dividida, nem a maldade do homem civilizado, tampouco o sentimento de vingança dos homens.
Um cão tem a beleza de uma existência completa em si mesmo.
E apesar de todas as divergências, quanto ao desenvolvimento orgânico, o cão possui um sentimento de afinidade íntima e de solidariedade incontestável.
Na imagem, Freud e seu cão Jofi, da raça Chow Chow.
JP em 04.09.2024